terça-feira, 10 de julho de 2007

Sociologia da Pedofilia

A indignação e o combate mundial ante as redes de pedofilia, os abusos, o tráfico de crianças, a pornografia infantil e as piores formas de exploração de trabalho infantil são uma realidade. São por estas causas que, desde finais do século XIX, vários movimentos têm encetado acções, lutas, reivindicações e estratégias. No entanto, o passado e o presente das crianças caracterizam-se pela não garantia dos direitos da criança. O que reservará o futuro às crianças?
Há poucas semanas foi desmantelada uma rede de pedofilia por polícias de 35 países, numa operação que durou quase um ano e salvou 31 crianças do abuso e da exploração. A agência britânica de protecção da criança na internet e de luta contra a pedofilia ‘Child Explotation and Online Protection Centre’ (CEOP), criado em 2006 no Reino Unido, dirigiu a investigação, e encontrou milhares de imagens e filmes de crianças abusadas sexualmente.
A Convenção dos Direitos da Criança, aprovada em 1989, pela Assembleia Geral das Nações Unidas, define no artigo 19, que os países signatários devem tomar "todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e educativas" adequadas à protecção da criança, inclusive no que se refere à violência sexual.
Chegados ao século XXI e temos ainda necessidade de discutir os novos básicos, como afirma Boaventura de Sousa Santos, que são questões fundamentais de dignidade humana, neste caso, de dignidade das crianças.
Se nos limitarmos aos países centrais pode dizer-se que há a consagração formal de um conjunto de direitos das crianças, conseguida sobretudo mediante mudanças introduzidas na legislação. Podemos afirmar que a expansão do discurso da promoção dos direitos das crianças foi penetrando nas instituições sociais e políticas, todavia estamos muito longe de uma situação ideal e plena no respeito desses direitos.
É urgente tomar medidas, ao nível nacional e internacional, para combater fenómenos com a venda de crianças e dos seus órgãos, a exploração e o abuso sexual, incluindo a sua utilização para fins pornográficos, prostituição e pedofilia e combater os mercados altamente lucrativos existentes nessa área. Mas a construção global da infância e os direitos das crianças estão desvalorizadas em relação às considerações, interesses e estratégias económico-políticas. O reconhecimento do melhor interesse da criança ou interesse superior da criança é difícil de separar daquilo que são os melhores interesses das corporações e das multinacionais, das opções orçamentais nacionais e algumas das imagens e concepções da infância que ainda vigoram nas nossas sociedades.
Dois episódios recentes em Portugal demonstram-nos como a garantia dos Direitos das Criança ainda é um horizonte longínquo... ou quase.
O primeiro episódio refere-se à recomendação recente do Conselho da Europa ao Estado Português para proceder a uma alteração legislativa na sequência do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que admitia como aceitável as bofetadas às crianças.
O segundo refere-se ao acórdão que reduziu a pena a um pedófilo em função da idade da vítima. Quatro juízes conselheiros entenderam que abusar sexualmente de um menor de cinco, seis ou sete anos é diferente de o fazer a um que tivesse treze anos. Defenderam que a pena de sete anos e cinco meses aplicada ao indivíduo que abusara de um rapaz de 13 anos era excessiva, por este ser capaz de sentir desejo sexual.
Este processo já resultou na queixa à UNICEF, que poderá avançar agora para o Tribunal Europeu, pedindo a condenação do Estado Português, uma vez que segundo a Convenção dos Direitos da criança, ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990, os tribunais não podem discriminar as crianças em função da sua idade. Para o Direito (e para os tribunais), a idade de uma criança não pode ser invocada para justificar um tratamento desigual na Justiça.
A garantia dos direitos da criança não ocorreu e se esta tendência continuar, o presente e futuro das crianças continua a ser sombrio, imprevisível e pautado por uma multiplicidade de perigos.

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